Ah, e tem o amor... quer algo que transforme mais o ser humano que esse sentimento? Com o tempo, a gente vai percebendo que tanta coisa muda, mas o amor está sempre lá, pronto a aparecer da forma mais impensável, improvável. Num esbarrão na rua, numa livraria, numa coincidência entre duas pessoas que pedem o seu café igual e que se veem todos os dias na cafeteria da esquina, mas nunca se falavam. Basta um encontro casual, e bingo! Como que atraídos por alguma força misteriosa [insira aqui sua definição: Deus, destino, ou algo equivalente], os envolvidos repentinamente sentem que suas vidas nunca mais serão as mesmas depois daquele dia.
E a gente conhece tanta gente. E elas são incríveis. E mais louco ainda é pensar em como se dá o processo de se apaixonar por uma pessoa em especial, entre tantas possibilidades. Não que eu veja nisso algo de ruim, muito pelo contrário. Bauman diz que esse é grande problema dos tempos atuais, de amores instantâneos e voláteis: comprometer-se com uma pessoa significa desbravar uma terra desconhecida e se aprofundar em um oceano particular, conhecer sua ecologia e as espécies mais bizarras que existem lá no fundo, onde nem a luz chega. Parece mais trabalhoso do que nadar em vários mares. Mas, claro, só até onde o pé toca a areia. Ali no rasinho da praia, onde não há perigo de se afogar e se pode sair a qualquer instante, sem se deixar levar pela força da maré.
E por que então todos idealizam tanto o amor? Eu tenho uma teoria de que pessoas que buscam aquele alguém ideal (leia-se: lindo, sexy, descolado, bem sucedido profissionalmente e com uma conta bancária acima de 3 dígitos) na verdade não estão dispostas a nada. Ou melhor, estão comprometidas somente com elas mesmas. É o mais puro e claro caso de auto sabotagem. Ninguém nunca é bom o suficiente. Já cansei de ouvir “ah, mas ele não se veste bem!”, “como vou sair com uma pessoa que não tem carro pra me pegar em casa?” e outras coisas parecidas, que não posso deixar de me perguntar se na verdade tudo não passa de uma desculpa esfarrapada para mascarar um egoísmo latente disfarçado de critérios exagerados de seleção. Depositam-se expectativas tão altas que é humanamente impossível encontrar todos os pré-requisitos num sujeito só.
Nenhuma gafe no primeiro encontro, tudo impecavelmente ensaiado, assuntos que não devem ser trazidos à tona, gestos coordenados de acordo com o mais recente sucesso editorial que ensina como se comportar durante a paquera. Cruze as pernas e passe a mão no cabelo, lançando um olhar fulminante. Tudo muito robótico, muito produzido, muito fake. Esse é meu desafeto com o mundo da moda: parece que as pessoas estão introjetanto uma coisa meio editorial constante das grifes no dia-a-dia. Caras e bocas perfeitamente calculadas e treinadas em auto retratos infinitos, olhares lânguidos, câmeras digitais e espelhos. E a naturalidade, cadê? Onde foi parar o nervosismo que te faz derrubar cerveja na própria roupa, pra logo depois de o rosto corar, explodir numa risada que mais aproxima que afasta?
Quero mais gente de verdade. Gente que não se ensaia. Quero mais improviso. Que não descarte possibilidades, que deixe chover sem se preocupar se vai estragar o penteado. Que goste de sorvete de chocolate, mas não deixe de experimentar o sabor exótico, sei lá, nozes com damascos [nem sei se existe, mas caso não tenha, taí uma ótima dica pros sorveteiros de plantão!]. Mais: quero gente que não exatamente saiba o que quer nem o que procura, mas que esteja louca pra descobrir.